sábado, 5 de maio de 2012

O Famoso Caderno. M. Teixeira Gomes sobre António Nobre. 4.

Junho, 29.

Janto com o Nobre em " York House " e depois, passeando, encontrámo-nos no pátio do " Internacional " com o Eduardo Perestrelo, rapaz magro, loiro, olhos azuis, afectando na expressão a ternura meridional e nutrindo por Madame Verharghe uma paixão desenfreada. Apresento-lhe o Nobre e ele apresenta-me o Baltasar Cabral, mocinho de olhos espertos, bigodinho preto e untado, e um falso ar romântico, tal como convém ao amante oficial de " uma senhora da nossa primeira sociedade ".
Esperamos a saída dos Verhaeghe, que jantaram no hotel com vários amigos e então houve um sarilho de apresentações: o Nobre aos Verhaeghe; minha à condessa de Cranneville, com quem devo jantar amanhã no " Bragança ", a convite do Della Faille, etc.
Depois fui com o Nobre ao Terreiro do Paço, onde se organizava, entre chuvas e insultos dos populares, o tão decantado cortejo de homenagem à Rainha, e volto à Avenida, no alto da qual a Corte aguardava a chegada do cortejo... que nunca chegou. Foi-se dispersando pelo caminho, graças à hostilidade do público, e às zaragatas que daí derivaram, sem falar na timidez ou cobardia dos indivíduos angariados para realizar a homenagem.
Na tribuna ocupada pela Corte, a pobre D. Amélia, com ar consternado, avultava como gigante entre pigmeus dando bordos de galera errante, pano todo fora, mas sem rumo certo. ( ... )
A noite terminou com a apresentação do Nobre ao Fialho, e embora aquele ainda estivesse ressentido pela forma como o outro zombara da mocidade poética da sua geração, portaram-se ambos bizarramente, trocando gabos e louvores de toda a espécie...

Id., Ibidem, pp. 194 e 195.

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