Ao Carlos Augusto Neves e Sousa Ramos, meu amigo de sempre.
Há cinquenta anos, em Luanda, fui com a minha mãe, uma jovem de vinte cinco anos e a Dra. Elisa Canas, Directora da escola primária Dr. João das Regras, na Maianga, onde estudei até à quarta classe, participar nos funerais dos polícias mortos pelo primeiro ataque do Movimento de Libertação dos Povos de Angola, que dera início à Guerra Colonial.
Recordo que houve tiroteio junto ao Cemitério, que viemos em grande correria a fugir para o carro e que, de regresso à cidade, estivemos presos num engarrafamento monumental, o primeiro da minha vida.
Em casa, à noite, a família reunida na sala, com enorme preocupação e eu, escondido na dispensa, pensava poder viver ali refugiado para o resto da vida... Dormiria deitado no chão e teria toda a comida de que necessitasse nas prateleiras...
Oh, que inocência...
Meu pai, para fugir à confusão de Luanda, resolveu levar a família para a nossa fazenda de café, no Quanza Norte, a fazenda Montes Claros, que fora do meu avô, a Oliveira Gomes e Filhos, Ltd.
Aí foi pior... Em Março, rebenta a União dos Povos de Angola nesses campos de colonos e cafezeiros, com as atrocidades dos ataques de surpresa e à noite, que são bem conhecidos.
Avisado pelo PBX desses ataques, o meu pai só teve tempo de meter a família num Jeep e fugir para Luanda. Só conseguimos chegar ao Úcua, onde me recordo de dormir num armazém, com outras crianças, mulheres e idosos, protegidos pelos homens que no exterior faziam guarda da forma que podiam.
Acabámos a viagem de regresso em coluna militar, que para o efeito nos tinha ido lá buscar.
Nunca mais voltei ao Quanza Norte. Mas tenho para sempre na minha memória as brincadeiras que por lá fazia, na fazenda e no Bula, uma vila próxima, onde os meus pais tinham uma casa fabulosa, de que tenho ainda muitas fotografias.
Foi aí, nos jardins da casa, que aprendi a andar, sempre protegido pela minha lindíssima mãe.
Vejo-o hoje nas fotografias que preservo, com imensa ternura.
E penso... já lá vão cinquenta e cinco anos...
E a Guerra Colonial faz agora cinquenta anos.
Hoje, a minha mãe, que já tem setenta e seis anos e a minha irmã, com cinquenta e um, vão viajar para o Recife.
Vou agora sair de casa, para me ir despedir delas ao Aeroporto da Portela.
sábado, 5 de fevereiro de 2011
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M.P.L.A. , Movimento Popular dos Povos de Angola... Desculpa a imprecisão...
ResponderEliminarNo outro dia, a passear pela minha "não memória", apareceu-me o seguinte:
ResponderEliminar"MEMÓRIA"
Memória presente, ou
equivocadamente ausente
agarrada a estória atrasada
chega-nos sempre imaginada.
Braço que nos guia, ou
descalabro ao viver do dia
será possível passado
ou futuro que nos chega
adiantado.
Caminha-se assim na corda esticada
da vida maltratada
agindo-se a pedido
e não no sentido
de um desejo lentamente construído
esbarrando no existir
de um possuído mal-entendido.
(fim)
Em retribuição ao teu post e agradecendo a tua contribuição para que a minha memória se vá sentido menos só, fica-me com este meu poema.
Claro que sim, amigo. Um abraço muito grande !
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