segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O Famoso Caderno. A Frutaria.

Atravessou a longa avenida às onze da manhã,
estava Sol no passeio oposto, mas não lhe apeteceu
apanhar Sol, nem havia passadeira por perto
e os táxis andavam rápido, de um lado para o outro.

No quiosque demorou-se a olhar as capas das revistas,
lá estavam as que comprava sempre, uma era semanal,
as outras duas mensais. Depois viu os filmes pendurados,
vagamente percebeu que eram de ação, não gostou das capas,
eram escuras e mostravam carros aerodinâmicos em voo
e atores em poses marciais, num fundo de atrizes talismã.

Acabou por levar um jornal diário para a esplanada,
escolheu uma mesa à sombra, acendeu um cigarro,
sabiam-lhe sempre bem os cigarros de manhã,
pediu um café e uma garrafa de água mineral
e dispôs-se a ler de perna cruzada, levemente
recostado na cadeira, o cigarro a arder entre os dedos.

Agora eram os autocarros que travavam para estacionar
nas paragens repletas, uma de cada lado da avenida.

Tinha que passar pela frutaria, mas deixou-se ficar
mais um pouco, acabou de folhear distraidamente
o jornal, fechou-o e dobrou-o como fazia sempre
e pousou-o no tampo da mesa, junto da chávena vazia,
da garrafa aberta, do copo ainda cheio dessa água
tão fresca, de que gostava tanto pela manhã.

Já passava do meio-dia quando resolveu levantar-se,
tinha mais vida do que ficar simplesmente ali
a olhar os passeios, sem os ver, as árvores frondosas,
as fachadas antigas dos prédios de rendimento,
silvos, bicicletas, pessoas, sacos de plástico e cães
e o empregado muito veloz de bandeja em riste
e senhoras idosas muito pintadas e grupos de velhotes
e adolescentes de mochila e pedintes sem-abrigo
e sem os ver, atravessou a rua, com o jornal ainda
dobrado debaixo do braço, dirigiu-se para a frutaria.

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