domingo, 6 de março de 2011

W. G. Sebald na Ilha de Rousseau, a Ilha de Saint-Pierre, no Lago de Bienne.

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Em particular à noitinha, depois de os excursionistas do dia terem voltado para casa, a ilha mergulhava num sossego como já quase não se encontra no espaço da nossa civilização e nada bulia além, talvez, das folhas dos grandes choupos com a brisa que por vezes perpassava pelo lago. Os caminhos revestidos de fina gravilha calcária iam-se tornando mais claros à medida que eu os ia percorrendo à hora em que se adensa o crepúsculo, e passei por cercados de pasto, por um campo de aveia sem amanho, por uma vinha e por uma barraquinha de vindimador até que, já sem luz do dia, cheguei ao talude que sobe para a orla de um faial e daí onde vi acender-se, uma a uma, as luzes na margem oposta. O anoitecer parecia subir do lago e por um instante, quando olhava para baixo, formou-se dentro de mim uma imagem semelhante a uma estampa a cores num velho manual de ciências naturais que mostrava, mas muito mais bonitos e nítidos do que nesses desenhos a cores, um sem-número de peixes variados, mostrava-os a dormir nas correntes profundas entre negras paredes de água, uns atrás dos outros e uns por cima de outros, grandes e pequenos, sargos e ruivos, vairões e muges, bogas e lúcios, trutas salmonadas e trutas-comuns, solhas e barbos e tainhas e percas e carpas.
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W. G. Sebald, O Caminhante Solitário, " J´aurai voulu que ce lac eût été l´Ocean... ", Editora Teorema, Lisboa, Setembro de 2009, pp.43 e 44.

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