Sem pensar e sem querer,
há muito tempo,
à hora da matiné.
Era preciso espreitar
para lá do muro,
sabiam?
Havia um muro.
Um muro que não servia
para nada.
Um muro por desfazer.
É tão tarde agora.
É tão tarde,
sempre.
Víamos os filmes,
sem saber os títulos.
A Romy Schneider,
o Alain Delon...
Depois,
nem tu sabias onde íamos,
ninguém sabia.
Nem tu com o teu sorriso
cúmplice,
o sorriso de miúda.
Ficávamos pelas esplanadas,
quase sem falar,
para quê?
Os teus últimos amigos,
à luz das lâmpadas,
estão tão sós.
E tu,
que os conhecias a todos,
onde estarás?
Não sei porque fiquei
por aqui.
Porque fui eu
que fiquei.
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
quinta-feira, 20 de janeiro de 2011
As Tardes de Inverno na Baixa de Lisboa.
Miguel ensaiava Tancredo
porque adorava Monteverdi,
scones e chávenas de chá.
O eléctrico chorava
avenida abaixo
e ao fundo, a Outra Banda
afundava-se numa cinza
veneziana.
Era tão triste ver
os ferrys para lá
e para cá.
Às vezes apagavam-se
quando atracavam
em Cacilhas.
E nós deixávamos,
de os ver.
Miguel, entretanto,
voltava aos madrigais...
Eu abotoava o casaco
ao frio do entardecer.
porque adorava Monteverdi,
scones e chávenas de chá.
O eléctrico chorava
avenida abaixo
e ao fundo, a Outra Banda
afundava-se numa cinza
veneziana.
Era tão triste ver
os ferrys para lá
e para cá.
Às vezes apagavam-se
quando atracavam
em Cacilhas.
E nós deixávamos,
de os ver.
Miguel, entretanto,
voltava aos madrigais...
Eu abotoava o casaco
ao frio do entardecer.
quarta-feira, 19 de janeiro de 2011
sábado, 15 de janeiro de 2011
Insónia.
Não me importa o nevoeiro
que, desde manhã, tudo dissipou,
as portas abertas da varanda envidraçada
e a senhora simpática com nariz de buzina,
que nos serviu o café numa cafeteira
e o bolo de arroz muito fresco,
a chuva soprada pelo vento,
a cinza fria da rua molhada
e os passeios vazios,
o ciclista que aparece de repente
e o ar altivo com que se cruza connosco,
um cão que saltita de muro em muro
e nós já não vimos,
o regresso rápido no automóvel veloz,
para a esplanada junto ao Cabo,
enregelados já,
os olhos molhados
e outro café
e um cigarro
e outro.
Não me interessa que o nevoeiro
cheirasse a pólvora queimada
e a manhã parecesse madrugada,
de novo no carro, pela marginal fora
e as chaminés de fumo branco,
a relva molhada, muito verde
e o teu sono,
o teu silêncio
adormecido,
os teus olhos
de veludo.
que, desde manhã, tudo dissipou,
as portas abertas da varanda envidraçada
e a senhora simpática com nariz de buzina,
que nos serviu o café numa cafeteira
e o bolo de arroz muito fresco,
a chuva soprada pelo vento,
a cinza fria da rua molhada
e os passeios vazios,
o ciclista que aparece de repente
e o ar altivo com que se cruza connosco,
um cão que saltita de muro em muro
e nós já não vimos,
o regresso rápido no automóvel veloz,
para a esplanada junto ao Cabo,
enregelados já,
os olhos molhados
e outro café
e um cigarro
e outro.
Não me interessa que o nevoeiro
cheirasse a pólvora queimada
e a manhã parecesse madrugada,
de novo no carro, pela marginal fora
e as chaminés de fumo branco,
a relva molhada, muito verde
e o teu sono,
o teu silêncio
adormecido,
os teus olhos
de veludo.
domingo, 9 de janeiro de 2011
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011
Paixão.
Com estrépito, contra as rochas,
a espuma gelada, a espuma
suja.
As ravinas a pique,
sobre a fúria do mar.
Entretidos com as máquinas simples
de furo, em que os prémios são
chocolates,
a electricidade das juke-boxes
e a matiné ao Sábado.
Tanta
ternura.
Nesse tempo,
a noite caía em caramelo,
o rock´n´roll lá longe,
os carros ligeiros estacionados,
chutney de kiwi.
O tom de baunilha dos caracóis
do teu cabelo,
o tecido da china do teu vestido
e o cinto,
a fivela dos sapatos abertos
de salto alto.
Um espada levou-te depois
para perto do mar,
a baía extensa
na noite escura.
Junto à traineira tombada,
um rolo de nylon
sujo de areia,
algas secas
e lixo.
Depois, levaste dias a passear
junto ao molhe.
Sozinha,
em silêncio.
Tão bela
e nenhum filipino,
de passagem,
te viu.
Nenhum malaio
te amou.
a espuma gelada, a espuma
suja.
As ravinas a pique,
sobre a fúria do mar.
Entretidos com as máquinas simples
de furo, em que os prémios são
chocolates,
a electricidade das juke-boxes
e a matiné ao Sábado.
Tanta
ternura.
Nesse tempo,
a noite caía em caramelo,
o rock´n´roll lá longe,
os carros ligeiros estacionados,
chutney de kiwi.
O tom de baunilha dos caracóis
do teu cabelo,
o tecido da china do teu vestido
e o cinto,
a fivela dos sapatos abertos
de salto alto.
Um espada levou-te depois
para perto do mar,
a baía extensa
na noite escura.
Junto à traineira tombada,
um rolo de nylon
sujo de areia,
algas secas
e lixo.
Depois, levaste dias a passear
junto ao molhe.
Sozinha,
em silêncio.
Tão bela
e nenhum filipino,
de passagem,
te viu.
Nenhum malaio
te amou.
terça-feira, 4 de janeiro de 2011
segunda-feira, 3 de janeiro de 2011
" Tivesse eu sabido ", de A. C. Swinburne.
Tivesse eu sabido, quando a vida era como um vento tépido e feliz,
Brando e ruidoso na aurora e na névoa brilhante do orvalho,
Que havia de chegar o tempo em que, suspirando, os corações diriam:
" Tivesse eu sabido... "
Nem sequer as rosas rindo ao beijarem-se,
Nem, ao sol, o mais encantador riso ondulante do mar,
Teriam vindo fascinar a minha alma para que neles reparasse.
Agora o vento é como uma alma desterrada a rezar inutilmente
As preces que não conseguimos ouvir se o coração lhes resiste,
Agora que a minha própria alma, à deriva e perdida como o vento, suspira:
" Tivesse eu sabido. "
A. C. Swinburne, Poemas, Tradução de Maria de Lourdes Guimarães, Relógio D´Água Editores, Lisboa, Outubro de 2006, p.163.
Brando e ruidoso na aurora e na névoa brilhante do orvalho,
Que havia de chegar o tempo em que, suspirando, os corações diriam:
" Tivesse eu sabido... "
Nem sequer as rosas rindo ao beijarem-se,
Nem, ao sol, o mais encantador riso ondulante do mar,
Teriam vindo fascinar a minha alma para que neles reparasse.
Agora o vento é como uma alma desterrada a rezar inutilmente
As preces que não conseguimos ouvir se o coração lhes resiste,
Agora que a minha própria alma, à deriva e perdida como o vento, suspira:
" Tivesse eu sabido. "
A. C. Swinburne, Poemas, Tradução de Maria de Lourdes Guimarães, Relógio D´Água Editores, Lisboa, Outubro de 2006, p.163.
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